Há diversas provas de que a Nossa
Civilização está a chegar ao fim.
Uma delas consiste na
perda de referências que
durante séculos
permitiram organizar o pensamento.
Isso verifica-se na pintura, por exemplo. Quando
era figurativa, a pintura tinha um referencial
– que era a realidade. Era possível dizer se um
quadro estava
‘bem’ ou ‘mal’ pintado, confrontando-o
com a realidade
que pretendia retratar. Claro que isso não
bastava. Tinha
de haver algo mais, um estilo, um toque de
génio que
diferenciasse um pintor dos outros. Mas esse
‘referencial da
realidade’ perdeu-se. Hoje temos quadros
todos pretos ou
todos brancos. Não é possível saber se
estão bem ou
mal pintados.
E o mesmo pode dizer-se para a escultura, para a
literatura,
para o cinema
ou para a música
A melodia – ou seja, uma linha de continuidade que o
ouvinte seguia
e ia acompanhando – desapareceu da maior
parte das
músicas contemporâneas. Muitas delas são
conjuntos de
sons dispersos, aparentemente sem ligação
entre si
fazendo grande ruído!
E na escrita verifica-se o mesmo. Um romance contava
uma história – que podia ser a história de uma pessoa,
de
uma família ou
de um grande amor. Mas muitos dos
romances que
hoje se escrevem não têm história. As frases
são agrupamentos de palavras que podem fazer ou não
sentido. Também
aqui o ‘referencial da realidade’
desapareceu. Não se pode dizer se a história é boa ou
má, verosímil
ou inverosímil, porque deixou de haver história.
E com o cinema passa-se a mesmíssima coisa. O chamado
‘enredo’ perdeu-se.
.Mas não só nas artes se perderam as referências. Em
muitas outras
áreas se nota essa ausência de nexo, ou
de sentido, ou
de lógica. Por exemplo, nos cabelos
cuidadosamente despenteados; na fralda da camisa por
fora das calças; uso de calças com o rabo à mostra,
nos
sapatos a que se retiram os atacadores, boné com a
pala
virada para trás: A juventude na linguagem oral dizem
“boé” para
dizerem é bom e muito.
Tudo sinais que pretendem transmitir às pessoas um ar
negligé, desimportado, de desprezo em relação às
convenções –
mas que no fundo representam exatamente
o contrário: um seguidismo cego em relação à moda…
Neste tema da falta de sentido das coisas – ou de uma
cultura do absurdo – o exemplo mais ridículo são as
calças rotas. As calças compradas na loja novas já
rotas
constituem o
exemplo máximo de uma civilização que
chegou ao fim da linha e já não consegue inventar mais
nada. Então põe-se a rasgar deliberadamente a roupa
nova. É o
nonsense no seu máximo esplendor!
Tudo começou com os ‘jeans lavados’.
Quando os bluejeans apareceram, tinham naturalmente
Quando os bluejeans apareceram, tinham naturalmente
a cor da ganga
azul. E assim viveram uns bons anos.
Mas a dada
altura alguém se lembrou de dar aos jeans
novos um ar
usado – e aí apareceram nas lojas os
‘jeans lavados’. Os jeans novos, com ar de acabadinhos
de sair da
fábrica, tornaram-se um sinal de parolice, de
pessoa pouco
‘vivida’. E os jovens queriam parecer ‘vividos’...
Mas, como todas as modas, os jeans lavados
banalizaram-se
– obrigando os
criadores a puxarem pela cabeça. Mas não
tiveram grande
imaginação. Dos ‘jeans lavados’ passaram
aos ‘jeans
puídos’, ou seja, gastos em certas zonas para
parecerem muito
usados. E a machadada final foram os
rasgões.
Primeiro nos joelhos, mas depois em toda a parte.
Hoje vêem-se
jeans a que faltam praticamente as coxas
– substituídas por gigantescos buracões! As pessoas
que
as vestem
tornam-se cómicas. Dão imensa vontade de rir,
parecendo
palhaços pobres!
Entretanto, para dar algum sentido
útil a uma moda sem
sentido nenhum, arrisco-me
a fazer uma sugestão.
Sugiro às empresas de confeção
têxtil que façam
convénios com ONGs atuando em países
do terceiro
mundo para enviarem para lá jeans novos –
recebendo
em troca jeans velhos e usados. Que têm mais
valor do
que os que se vendem nas lojas,
porque foram envelhecidos
pelo uso e não de modo artificial. E que podem
inclusive
ter andado na guerra, exibindo rasgões feitos
em combate
ou mesmo buracos de balas.
Que tal?
Os consumidores ocidentais poderiam
satisfazer a sua ânsia
de frivolidade – e as populações
desses países pobres teriam
o prazer de usar calças novas