| Natal na guerra
   Os hobbies de alguns  militares durante   a guerra
  em Moçambique. À noite na
  Cantina do Silva em Moçambique, jogava-se com
  vício e paixão.  No final de cada partida estalam
  ferozes  zaragatas. Ávidos, os vencedores conferem  os ganhos, os azarados soltam pragas e blasfêmias.  Desconfiam de
  ter havido batota,no jogo, suspeita agravada pelo
  efeito do álcool, da liamba, e do calor e do isolamento. Quando algum ficava depenado. Com os  bolsos do camuflado vazios,  levantava-se furioso da mesa de  jogo.   Outro tomava logo o seu lugar na mesa da lerpa. O que saía a rosnava   insultos, a cuspir palavrões.  As noites são sempre iguais naquel minúsculo reduto militar no Lago  Niassa-Cobbué, quase paredes- meias com o Malawi e a Zâmbia. Naquela noite de consoada,a estúrdiam e os excessos mostramvam-se piores  do que nunca. Quem perdia ficava agastado, rumava para a caserna deserta, procurava refúgio num instrumento
  de música. Voltava cá para fora tal como entrara. Agora, sozinho, caminhava ao longo do arame farpado, sob
  um céu  coalhado de estrelas.  O ar fresco
  fazia- lhe bem. Sentia-se outro.  Pensava no Natal e olhava para o céu à  procura do astro que guiava aos reis magos. Apaziguado pela refulgente aletria cósmica, esquecia a batota, as minas,  as emboscadas. Esquecia a picada, esse palco de guerra e  tragédias ali
  bem à vista. Subitamente um vagido sobe no ar, enchendo  de sentido a
  noite. A poucos metros, numa palhota para lá da  cerca de arame farpado, nascia um menino.  Um menino
  negro, entre palhas!  Que simbolizava o Menino Jesus. |