segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

 

 


Natal na guerra

 

Os hobbies de alguns  militares durante  

a guerra em Moçambique.

À noite na Cantina do Silva em Moçambique, jogava-se com vício e paixão. 

No final de cada partida estalam ferozes

 zaragatas. Ávidos, os vencedores conferem 

os ganhos, os azarados soltam pragas e blasfêmias.

 Desconfiam de ter havido batota,no jogo, suspeita agravada pelo efeito do álcool, da liamba, e do calor e do isolamento.

Quando algum ficava depenado. Com os 

bolsos do camuflado vazios, 

levantava-se furioso da mesa de 

jogo. 

 Outro tomava logo o seu lugar

na mesa da lerpa. O que saía a rosnava 

 insultos, a cuspir palavrões. 

As noites são sempre iguais naquel minúsculo reduto militar no Lago 

Niassa-Cobbué, quase paredes-

meias com o Malawi e a Zâmbia.

Naquela noite de consoada,a estúrdiam e os excessos mostramvam-se piores 

do que nunca.

Quem perdia ficava agastado, rumava para a caserna deserta, procurava refúgio num instrumento de música.

Voltava cá para fora tal como entrara.

Agora, sozinho, caminhava ao longo do arame farpado, sob um céu 

coalhado de estrelas.

 O ar fresco fazia- lhe bem. Sentia-se outro.

Pensava no Natal e olhava para o céu à

 procura do astro que guiava aos reis magos.

Apaziguado pela refulgente aletria cósmica, esquecia a batota, as minas, 

as emboscadas.

Esquecia a picada, esse palco de guerra e

 tragédias ali bem à vista.

Subitamente um vagido sobe no ar, enchendo 

de sentido a noite.

A poucos metros, numa palhota para lá da 

cerca de arame farpado, nascia um menino.

 Um menino negro, entre palhas!

Que simbolizava o Menino Jesus.

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